Adeus não pronunciado
Antonio Miranda Fernandes
O adeus não pronunciado.
Evitado,
Como espaço para arrependimento
Caso o vício não seja vencido.
O hábito continuado por mais algum tempo,
Amarrado como parte da vida.
Na cama arrumada com cuidado,
A presença da ausência.
O abajur apagado não vela
Na mesa-de-cabeceira, o seu retrato
Com o olhar virado para a porta do quarto,
E nos lábios sorriso insinuado,
Sem fazer beiço de tristeza.
Despedida.
A chave da porta da rua
Num anel de metal de chaveiro,
Abandonada sobre a cômoda,
Tal aliança devolvida de namoro desfeito.
A janela aberta para o mundo lá fora,
A cortina com sutil panejar.
Como lenço num aceno de adeus.
Um pedaço de sol no assoalho,
Esquecido,
Onde estariam os chinelos seus.
O tic-tac do relógio de louça,
A moça bailarina a girar como o mundo.
O seu perfume nas fronhas,
Quebrando o silêncio em cacos pequenos.
A vida fluindo para o ponto de fuga
Como se nada tivesse acontecido.
Um desacato para os meus sentimentos.
Esquecido no lavatório,
Um pedaço de papel higiênico
Com excesso de batom.
A sua escova de dentes no armário
Com a porta aberta.
Um sabonete para pele de nenê
Abandonado pela metade.
As florinhas dos azulejos embaçadas.
Sobre o biombo dos colibris desavisados,
A toalha ainda molhada e impregnada,
Com o aroma do seu corpo.
O gotejar do chuveiro mal fechado,
Como lacrimejar sem sentido na realidade.
Esbulho do meu orgulho.
Morte da minha alegria sem fantasia,
No despeito do adeus não pronunciado.
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