Asas fechadas
Antonio Miranda Fernandes
 


No desapego as palavras ficam exaustas pelo
Esforço de doar som ao vazio.
O olhar com a luz esmaecida pelo suor
Que antes escorria pela ousadia dos peitos nus,
Confunde a imagem do outro lado do pensamento,
E arregala-se como estampasse o horror do medonho.
Malquisto intruso a estremecer a serenidade que estava...

O tempo puído nas juras e segredos fundidos,
Perde-se na distância da contramão do silêncio.
No chão, no céu, do lado direito e do lado esquerdo,
Um feixe de receio que o medo completo já nem conta,
Desponta mas se intimida na sobra do quase nada.

A cumplicidade das pedras da esquina,
Que ressoavam os sapatos nas madrugadas,
Com passos que se afastavam quase saltitantes de alegria,
Está emudecida.
Perderam-se os ecos nas gramas mortas entre as juntas secas...
Sem poças d'água...
Sem o reflexo das estrelas...

Suponho...
Há a sombra e é preciso dela para entender da claridade,
Mas a ausência de contornos incomoda...
É naco de sonho feliz na promessa derradeira,
Que desejava perdurar toda vida.

As mãos cansadas
Dos adeuses repetitivos se retraem inibidas como asas fechadas
No voo interrompido que desiste da turbulência.
Os bilhetes de amor a esvoaçar borboletas sem graça,
Nas recordações de um jardim de flores murchas,
Sem aromas...
Sem o néctar atrativo...
Permanece a secura do viço no sorver as últimas gotas do visgo.

E no cansaço sem o aconchego de um peito abrigo,
Entre o chão e o teto...
Fechando o cubo das quatro paredes,
O oposto posto desafeto
É  linimento geométrico que não cura, mas dura demais.

O querer combalido...
O elo partido na amarra da paixão do barco à deriva
Em direção às rochas ferinas do acaso...
Na verdade pouco importa,
O urro no abismo das profundezas ou nos altos das escarpas,
Depois da coragem do salto.

A voz engasgada pela indiferença do desapego...
Enfim...
Retalhos de ruídos sem sentido.
A camisola da primeira noite, rasgada na ousadia da metáfora,
É destemperança na calma que se faz desistência.
Inacabada melodia de notas abandonadas...

Sal...
Esmola...
Reviver enquanto a memória puder e valer a pena.
E...
Fim porque é fim... Nada mais que a outra ponta do começo...
Desnecessário explicar... Não é ironia...
Está escrito ( dizem ) e por isso tem de ser assim...
A volta ao nada fechando o circulo e nada mais...
Bola de sabão no fluir das eras.
Se, por fim, no final da estrada restar réstia de paz,
Será menos mal.