Fonte que canta e arrulha
Antonio Miranda Fernandes
Foi o vento que do entardecer, soprou o ouro.
Permitindo o gris véspera da noite que se antecipava.
Levou de volta ao ninho a gaivota para chocar a sua pepita.
Corria cristalino como a fonte d’água que canta e arrulha,
E se simplifica sem querer saber do próprio nascedouro.
Cavou o oceano, esse sábio amigo e também tirano,
Necessário talvez a um plano desconhecido,
E que é capaz de afogar com um gesto caridoso.
Quem poderá julgar de onde provém o mal maior?
Soprou ondas que se espatifaram contra rochedos...
Pariu medos, relâmpagos e cegueiras...
Deu à luz... luzes das tormentas abertas expondo o útero do céu.
Turbilhões ergueram, lá longe, fantasmas dançantes de areia,
Que em fuga desfaziam dunas e buscavam o anonimato nas extensões dos desertos,
Em metamorfoses sem algozes e sem mártires.
Silêncios e abismos confundidos pelos ecos que afligiram distâncias e momentos,
E embaraçaram passos que seguiam ao caminho certo.
Desamparado e sentindo-se tolo,
O andarilho sentou-se na soleira da porta a perguntar-lhe
Por que ela não se abria?
Que estranho e enganoso castelo fingindo-se de belo
Enganava-se como Narciso entre janelas cerradas no nada?
Montes foram galgados, mas os cumes, infelizmente,
Mostram-se apenas aos solitários... Aos bem-aventurados...
Não mais mãos entre mãos...
Elas tombaram ao longo do corpo pelo peso do sonho,
Que souberam pretender, mas não aguentaram carregar.
Perpétuas apenas mentiras... ainda não verdades...
Muitos conflitos e alguns medos, gritos e mitos...
Perdido o olhar sangrento
Que busca na sombra a réstia de sono e nele a fagulha derradeira.
(a fonte que canta e arrulha)
Tudo o mais se tornou sem graça...
Epitáfio...cinzas...fumaça...num suspiro derradeiro.