Nevoeiro
Antonio Miranda Fernandes
O mundo parece-me estupidamente pequeno,
Pois não consigo na imensidão geográfica dele um lugar
Para que possamos falar.
Uma esquina...
Um trecho de rua...
Uma calçada...
Uma sombra de beiral...
Ou um muro branco...
Uma grade de jardim...
Para ficarmos namorando sem que
Nada da vida corriqueira pudesse se interpor entre os olhares
Que quase choram...
Às vezes sinto o peito apertado, quase esmagado,
Quando penso que o tempo a se esvair por entre os meus pensamentos
Não têm retorno...
Instantes natimortos...
Aí chega a doer...
Doer muito...
Muito...
Muito...
Muito...
Muito...
Neste preciso momento da manhã,
Diante da minha janela apenas um nevoeiro denso.
Parece que a vida cobre com uma catarata imensa
As luzes...
As cores...
As flores...
Que eu sei estarem lá...
Entre o horizonte oculto e os meus versos.
Como a certeza que o meu peito abriga saudade e as dores.
Nas tardes dos últimos estertores dos dias acontece o mesmo.
Também quando a noite esparrama estrelas...
Elas ao menos conversam comigo e querem me acarinhar.
Elas só podem vir para o meu olhar quando a noite se faz.
Nos momentos de rara felicidade em que nos olhamos, Tu e Eu,
Beijamos-nos com urgência, com pouco ou nenhum dizer.
Em outros nos atropelamos em declarar sentimentos.
De súbito o sentido da despedida num gesto de soltar as mãos,
E com meia volta nos damos às costas.
Cada um de nós leva consigo o outro,
Como se uma troca de almas fosse possível.
Quantas vezes engoli em seco, o pedido de:
“Fica comigo, por favor!”
Sinto o mundo ruir e os meus versos de amor, ainda sem asas,
Caírem no abismo como se nunca tivessem sido sentidos.
Sei que é inevitável o que temos para nos dizer,
E nos detemos na espera confiante que o mundo
No dia seguinte poderá ser diferente sensível às nossas súplicas.
Devo confessar que o meu peito anda debilitado por aguardar
Que o amor possa mudar a realidade e nos deixar no meio do nevoeiro
Longe dos olhares indesejados
E nos permitir instantes de confidência.
Não sei o que fazer...
Devo confessar que se a vida permitisse, sem que morrêssemos,
Que tudo pudesse ser apagado como se nunca tivesse existido,
Eu sairia da tua vida para não sofrermos mais.
Confesso que tenho procurado essa possibilidade...
Confesso!