Onde eu nunca estive
Antonio Miranda Fernandes
Sei que há alguém nalgum lugar, onde não fui,
que dia e noite busca-me com suas mãos
transbordantes de afagos e acalentamentos.
Sei que há um olhar que me guarda alegremente,
num rosto querido que só vejo em sonhos,
e não atrevo tocar por não ter mãos de anjo.
Imaginar esse olhar me descerra, embora
eu tenha me guardado como a mão fechada que
retém, na sua concha, uma pepita de ouro.
Nalgum lugar os dedos gráceis de alguém,
abrem-me como o sol, na primavera, abre tocando
delicadamente, o coração da primeira flor,
pétala por pétala... liberando o pólen.
Nem mesmo o orvalho tem mãos tão delicadas.
Nem a minha força e nada que eu possa imaginar
em tudo que existe no mundo, é igual ao poder
da tenuidade desse alguém: cuja sutileza semeia
esperanças cada vez que respira.
Os meus olhos (sem se verem nos olhos
desse alguém) percebem no seu olhar
a voz mais intensa que todas as flores, e ouvem
a macieza do silêncio das pétalas róseas,
que se abrem de manso, e sorriem para mim.
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