Manhã de ventos vazios
Antonio Miranda Fernandes 

De onde vieram os versos que sujaram os
Teus dedos com palavras que os teus lábios
Não me disseram quando eu, emudecido,
Olhava-te e as esperava como um alento?

Nesta manhã de ventos vazios o teu dizer
Torna-se duro e surpreende-me como seixo
Perdido num prato de sopa.
Por que me envias palavras que não são tuas?

O meu silêncio grita tão alto que nem posso
Ouvir os meus pensamentos.
Teu mutismo não devia ser interrompido para
Que eu não percebesse defeitos no que em
Mim já estava como perfeito.

Crises acordam para coisas que não vemos.
Aprendemos que perda é quando perdemos
Algo que amamos mais que a nós mesmos.

Não quero respirar versos em vozes surdas,
No desperdício de vida em águas estagnadas.
Não quero o gorjear de uma ave morta,
Tal réquiem no profundo amargo da memória.

Quero ouvir o meu nome no sutil bater de asas
Da aragem nos gravetos e folhagem que me
Dão a sombra para repouso e as agulhas do
Tempo projetadas no chão e, assim me iludir
Como se a voz fosse tua, pelo resto da vida.