Apenas uma imagem
Antonio Miranda Fernandes
Às vezes na madrugada, me deito com a porta entreaberta,
Acima da bruma que cobre o vale de pastagens até o horizonte que adivinho.
Ah como é prazeroso o zunir do vento por entre as frestas...
Vem povoado de histórias e arrepios de oceanos distantes...
De faróis mal-assombrados com o faroleiro a arrastar correntes...
Ou lembram as lamurias nas enxárcias de velhas naus piratas em mares bravios...
Ou como o estrídulo gorjeio das andorinhas trinta-réis entre abril e outubro,
Com as asas rentes às águas do mar,
Narrando umas às outras, como foi a viagem...
Ou falando às rochas de outras auroras...
De outras noites estreladas...
Antes da hora habitual os cantos dos galos descerrando as janelas para a manhã,
Já se fazem cinco horas no arco do tempo.
São tantos que interromperam os meus devaneios.
Acho que, como os meus pensamentos, eles estão desorientados.
Minha imaginação tem o voo em círculos embaraçado por um eclipse irreal,
Sem decidir qual o rumo a seguir.
Os meus pincéis repousam nos copos de solventes,
E o quadro abandonado no cavalete espera o arremate.
O poema nasceu com as letras confusas sem saber por que veio...
Sem razão de amor para ser... Apenas uma imagem que faz loucuras em mim...
Um dilema para permanecer o hábito da sensualidade nas letras antes das
gavetas...
Se não valer o meio e menos ainda o fim,
Mesmo assim, talvez se aproveite o começo.